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Agosto Lilás: em debate, violência contra a mulher

Palhocenses criam projetos para acolher e orientar vítimas

3c29c325750351b3b3c9ca33c58b49d5.jpg Foto: DIVULGAÇÃO

Por: Sofia Mayer*


O mês de agosto foi escolhido para promover conscientização e debate sobre a violência contra a mulher em todo o país. Regulamentada no estado desde 2019, a campanha é ainda mais necessária em ano de pandemia: segundo balanço do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, com as práticas de isolamento social, houve um aumento de mais de 35% nas denúncias pelo Disque 180 em abril de 2020, se comparado ao mesmo período do ano anterior. Já em Palhoça, durante a quarentena mais rígida no estado, em março, os registros de agressões a mulheres subiram de 232 para 249 em relação a 2019, segundo a Polícia Civil.

Mesmo com aumento no volume de registros, parte dos casos ainda escapa às estatísticas. Pensando em acolher essas mulheres que, por medo de retaliação e frequentemente sob ameaças, ainda não conseguem denunciar os abusos, a estudante de Direito Melissa Testa, moradora do Centro de Palhoça, criou o projeto #violenciadomesticaécrime em 2018, com canais para discussão e orientações sobre atendimentos de emergência no WhatsApp e no Instagram.

O grupo conta com atendimento especializado de advogadas e psicólogas. A dinâmica funciona mais ou menos assim: a mulher que deseja participar entra no grupo através do link disponibilizado, solicitando ajuda às voluntárias. Caso prefira, as profissionais retornam o contato de forma privada, a fim de preservar o desejo de sigilo da vítima. “No momento do atendimento, é identificada qual a necessidade da mulher, se ela está em segurança para falar, se quer ser ouvida ou se tem dúvidas sobre como acessar os serviços de atendimento de emergência, tirar dúvidas sobre a Lei Maria da Penha, como denunciar e medidas protetivas”, explica a idealizadora do projeto.

Ela comenta que as medidas de isolamento social, embora importantes para conter a propagação da Covid-19, propiciaram um aumento de casos de agressões a mulheres em território nacional. “Em algumas cidades, o número de casos de violência doméstica aumentou na mesma proporção da quantidade de pessoas que aderiram ao distanciamento social”, comenta. Nesse sentido, o grupo atua como um canal para que as vítimas peçam ajuda sem sair de casa. De acordo com Melissa, sem o convívio social e muitas vezes vivendo junto ao agressor, as mulheres têm dificuldade de buscar socorro.

Além de fazer o acolhimento às vítimas, há compartilhamento de informativos, matérias jornalísticas e eventos que abordam a violência doméstica e o feminicídio. “Que possamos diminuir os índices, que (isso) as encoraje a denunciar e quebrar o ciclo de um relacionamento permeado por violência”, expõe.


Dados revelam subnotificação

As estatísticas nacionais do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos revelam que, em abril deste ano, houve aumento de mais de 35% de denúncias pelo Disque 180 em relação ao mesmo mês de 2019. Nos meses de março e abril, cresceram em 22% os registros de casos de feminicídio, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. 

Em Palhoça, no entanto, após o mês de março, quando a quarentena rígida foi decretada, os números da violência contra mulheres vêm registrando queda. Segundo o Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC), que apurou que os índices estaduais também seguem baixando, não há uma explicação precisa para justificar a queda. Uma das respostas seria a percepção de que o cenário de pandemia possa ter acentuado a subnotificação no estado. "O que se tem observado nas informações colhidas junto aos promotores de Justiça que atuam no enfrentamento à violência doméstica contra a mulher, notadamente dos colegas que integram o Gevim (Grupo de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher), é que há, na verdade, um incremento da violência doméstica e familiar no período de quarentena, embora esse avanço não esteja sendo captado pelos boletins de ocorrência e pelos relatórios do Disque 180 e 190", afirma o promotor Jádel da Silva Júnior, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal e da Segurança Pública (CCR).


]Iniciativa nas redes sociais

A luta da palhocense Lilian Veber Orthmann, de 23 anos, contra a violência feminina vem do sangue. Formada em Direito pela Unisul e trabalhando juridicamente em um escritório de advocacia, ela vê de perto a rotina de familiares que atuam em delegacias especializadas no atendimento a mulheres. “Em tempos de pandemia, observamos o aumento de denúncias e de casos envolvendo a violência doméstica”, comenta.

Visualizando que, em geral, as mulheres ainda têm muito medo de realizar denúncias, a jovem passou a publicar materiais informativos a respeito do tema no seu próprio perfil no Instagram. Os conteúdos mostram maneiras de procurar ajuda ou registrar as ocorrências, além de propor reflexões a respeito de atitudes agressivas naturalizadas na sociedade. “Resolvi expor isso nas redes sociais, orientar, e tive um bom retorno. Senti falta desse tipo de orientação semanal nos jornais. As estatísticas são altas, e não são faladas. As mulheres não são orientadas”, afirma.

As publicações têm gerado bons números de compartilhamento, geralmente replicadas por mulheres. “Conversei com algumas, reforçando a orientação, e me propus a ajudar”, relata. Para ela, “em briga de marido e mulher, se mete a colher, sim”.


Ministério Público promove atividades 

Em virtude do aniversário da Lei Maria da Penha, que completou 14 anos na última sexta (7), o MP/SC, por meio do Gevim, do Centro de Apoio Operacional Criminal e da Segurança Pública (CCR) e do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), lançou a campanha "Violência doméstica: não se cale", que vai promover, durante todo o mês, uma série de atividades para informar e reforçar a importância de comunicar a violência aos órgãos responsáveis. 

As ações, sustentadas pelos pilares “informação, socorro e emergência”, estão acontecendo por meio do compartilhamento de uma cartilha informativa e de postagens no perfil institucional no Instagram e no Facebook. A campanha vai atuar respondendo dúvidas frequentes sobre a temática durante todo o mês de agosto.

A cartilha estampa ditados populares que naturalizam a violência contra a mulher, evidenciando raízes profundas e estruturais da problemática. A promotora de Justiça Helen Crystine Côrrea Sanches comenta que o cenário pode ser explicado pela própria história da civilização ocidental: “O uso da violência, nesse contexto, sempre foi aceito como meio corretivo ou de manter a mulher sob controle e subjugá-la à vontade do homem”. O informativo traz informações sobre o ciclo comum das agressões e enumera tipos existentes da violência, ajudando as mulheres a identificá-los.

Para a promotora, a luta contra a violência é de todos. "Pequenas atitudes podem contribuir muito para mudar essa realidade. As pessoas não devem tolerar qualquer violência contra a mulher, e, por isso, não podem se calar ou achar que não devem se envolver”, afirma. 

Dúvidas frequentes sobre registo online de boletins de ocorrência, funcionamento das casas de acolhimento e medidas protetivas serão respondidas por meio de vídeos nas redes sociais da instituição durante o período de campanha. 


Somando à luta

O Agosto Lilás também foi aderido pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social (SDS). Em razão da pandemia da Covid-19 e da necessidade do distanciamento social, contudo, as ações de conscientização serão em formato virtual, com realização de debates sobre o tema e por meio de postagens em redes sociais e sites de diversos órgãos e instituições do governo.

Um dos objetivos da iniciativa é fazer com que todos aprendam quais são os indicativos de um relacionamento agressivo e ajudem a denunciar as situações em que a mulher corre o risco de ser vítima de violência. “Campanhas são alertas. Estão sempre a nos lembrar que temos que mudar de atitude. Só com a conscientização do presente poderemos, sim, mudar o nosso futuro”, explica a secretária Maria Elisa da Silveira De Caro, quem lembra que o Agosto Lilás é uma conquista das mulheres catarinenses na luta pelo fim da violência.

 

* Sob a supervisão de Luciano Smanioto

 

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